Ao contrário dos que muitos pensam, coube a
Bill Wyman (ex-baixista dos Rolling Stones) os primeiros experimentos
com o baixo elétrico Fretless.
Bill Wyman (Rolling Stones) com seu fretless |
Exclamações como esta podem ser traduzidas em apenas uma palavra: respeito. O instrumento sem trastes requer amplos conhecimentos técnicos, bem como uma sólida noção de harmonia e melodia, uma vez que as notas, digamos, não estão “prontas” para serem executadas como em um contrabaixo com trastes. Nesta modalidade de instrumento, o baixista terá que “construir” cada nota a partir do posicionamento de seus dedos sobre a escala do baixo, onde, originalmente, estariam localizados os trastes, e isto, acreditem, não é fácil.
Primórdios
O instrumento sem trastes foi, sem sombra de dúvida, uma das mais notáveis descobertas do mundo dos graves e, ao contrário do que muitos pensam, coube a um ainda obscuro baixista de uma banda inglesa chamada Rolling Stones os primeiros experimentos com este inovador instrumento, seguindo o exemplo de muitas invenções geniais que ocorreram ao longo da história da humanidade: pelo simples acaso! Mas como tudo isto aconteceu?
O ano era 1961 e o jovem guitarrista Bill Wyman resolveu trocar de timbre motivado não apenas pelo fascínio que os graves exerciam em sua personalidade musical, como também pelo efervescente cenário da época, quando os Precision e os Jazz Bass estavam assombrando o planeta com a sua sonoridade. O primeiro instrumento de Wyman adquiriu em sua nova carreira era de origem japonesa. O novo baixista não tinha se adaptado ao instrumento em virtude dos trastes instalados no mesmo - grandes e desgastados pelo uso. Sendo assim, o músico levou seu instrumento a um luthier e solicitou que fossem substituídos por novos. Após uma verificação na escala, Wyman foi informado que os trastes específicos para aquele instrumento estava em falta e que chegariam dentro de alguns dias.
O acaso
Como na época o baixista possuía apenas este instrumento e necessitava urgentemente do mesmo para seu trabalho, ele solicitou que os trastes fossem retirados e que, enquanto aguardasse a chegada dos novos componentes, ele levaria o baixo de volta para usa-lo em seu trabalho. Para tentar obter as notas de uma escala sem trastes, Bill deduziu que a correta entonação das notas provinha da exata localização dos trastes ao longo da escala do instrumento. Desta forma, o baixista - no silêncio do seu quarto - tentou executar o baixo colocando cuidadosamente os dedos onde estavam instalados os trastes.
Em uma entrevista concedida a uma publicação inglesa, o baixista recorda como tudo começou: “Percebi que os sons resultantes eram bem delicados, puros, com outra timbragem e muito sustain, além de serem muito parecidos com o contrabaixo acústico. Fiquei fascinado com aquilo tudo e comecei a tocar minhas músicas sobre esta nova escala sem os trastes. Aquilo tudo me fascinou tanto que, quando finalmente os novos trastes chegaram, eu voltei a luthieria não para recolocar os componentes de volta na escala, mas para que fosse colocada uma leve camada de resina no sulco provenientes da instalação das peças”. Você poderá ouvir o som desta nova descoberta em muitas gravações dos Stones, com um destaque especial para “Paint in Black”.
Ampeg AUB-1 - primeira produção industrial
Ampeg AUB-1 Fretless. O braço possuia meia polegada a mais que os demais modelos
Não podemos nos esquecer de que isto foi um registro histórico de um jovem músico dentro do seu quarto e com sua banda que viria a ser tornar um dos maiores ícones do rock. Mas quando o processo de popularização do baixo fretless teve realmente um início, ou, em outras palavras, quando a sua produção justificaria um nível industrial para atender a uma crescente demanda?
Vamos viajar até Nova York, no final dos anos 40. Tudo começou com uma companhia chamada Ampeg, fundada por dois jovens baixistas acústicos: Everett Hull e Jess Oliver. A empresa fabricava amplificadores para contrabaixo e foi uma das responsáveis pelas primeiras experiências visando aumentar o ganho do sinal sonoro no baixo acústico. Hull começou a pesquisar um sistema que consistia num pequeno microfone pendurado (peg) dentro da caixa de ressonância ou instalado através de um suporte na parte externa do amplificador (de onde que surgiu o nome Ampeg).
A invenção foi um relativo sucesso de vendas para os músicos na época, principalmente para os contrabaixistas que utilizavam o acústico para gravar em estúdios. A Ampeg oferecia alguns modelos de baixo elétrico similares aos fabricados pela empresa Burns - sediada em Londres, na Inglaterra. Um dos seus modelos mais revolucionários foi o Baby Bass Electric Upright, que era, em síntese, uma nova versão do gigante, construído em fiberglass, sem a caixa de ressonância harmônica e com um sistema de captação embutido, facilitando o transporte e com aumento do sinal de saída.
Music Man Stingray Fretless usado por Pino Palladino
O mais importante em nossa história foi a decisão da companhia em fornecer o modelo em duas versões, ou seja, com e sem trastes. Assim, e 1996, foram concebidos os novos baixos elétricos da empresa de denominados AEB-1 (Ampeg Electric Bass 1) e o AUB-1 (Ampeg Unfretted Bass 1), destinados a músicos que gostariam de obter a sonoridade do gigante em um instrumento elétrico. A escala possuía um comprimento de 34 ½ polegadas, superior aos instrumentos construídos na época.
Fretless Precision Bass 1970
O novo baixo da Ampeg fez um considerável barulho entre os músicos daquela época. A lendária Fender resolveu lançar a sua versão de um instrumento sem trastes no ano de 1970. Uma doce ironia, já que a companhia tinha no nome, ‘Precision’, justamente o fato do baixista poder executar as notas com “precisão”, ocasionado pela presença dos trastes.
Este instrumento teve um volume modesto de vendas até o ano de 1976. Algo ocorreu então para que tudo isto mudasse: O lançamento do álbum-conceito “Jaco Pastorius”, colocando o mundo dos graves de ponta cabeça, com uma técnica tão virtuosa e apurada que ainda hoje é motivo de assombro para todos os membros do mundo dos graves. E o mais assombroso: toda aquela extraordinária sonoridade provinda de um surrado Jazz Bass 1962, na qual os trastes foram arrancados e substituídos por uma camada de resina. Este evento seguramente marcou o evento da era fretless no mundo.
Apesar de tudo que estava acontecendo naquele período, nunca ocorreu à companhia oferecer ao mercado um modelo fretless Jazz Bass. Felizmente, a partir de 1980, Bill Schultz retornou ao controle da empresa, determinando, algum tempo depois, que novos modelos fretless Jazz Bass fossem oferecidos ao mercado, incluindo, posteriormente, o magistral Fender Jazz Bass Relic, um customizado igual ao original que Jaco largou sobre a grama do Central Park no dia que faleceu e que foi roubado posteriormente e nunca recuperado. Uma perda imensa para todos nós...
Redação TDM
Comentários
Postar um comentário